Acordo amplia participação de vítimas da barragem de Mariana em decisões da Fundação Renova

O Ministério Público do Estado do Espírito Santo (MPES) assinou um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) com as empresas Samarco Mineração S.A., Vale S/A e BHP Billiton Brasil referente aos danos causados pelo rompimento da barragem de Fundão, em Mariana (MG), em novembro de 2015. O acordo visa a garantir que os atingidos pelo desastre ambiental tenham participação efetiva nas decisões da Fundação Renova, financiada pelas mineradoras e responsável por gerir a reparação dos impactos decorrentes da ruptura. O documento também foi assinado pelo Ministério Público de Minas Gerais, o Ministério Público Federal, as Defensorias Públicas dos Estados e da União e nove órgãos públicos.

Para a promotora de Justiça do MPES Mônica Bermudes Medina Pretti, coordenadora do Grupo de Trabalho de Recuperação do Rio Doce (GTRD) do MPES, o acordo amplia a possibilidade de recuperação dos danos. “Esse novo instrumento é a peça-chave que faltava para a concretude da reparação integral dos danos advindos do rompimento da barragem de Fundão. Agora, está garantida a efetiva participação dos atingidos em diversas instâncias. A estrutura da governança foi alterada, passando a ser centrada na pessoa atingida, que poderá contar com assessoria técnica”, salientou a promotora de Justiça, que assinou o termo pelo MPES. Ela acrescentou que o termo prevê, ainda, uma possibilidade posterior de repactuação dos 42 programas que já estão sendo implementados pela Fundação Renova.

O promotor de Justiça Hermes Zaneti Junior, integrante do Grupo de Trabalho de Recuperação do Rio Doce, destacou que a possibilidade de participação das vítimas do rompimento da barragem nas decisões da Renova. “Considero uma grande vitória para os atingidos e para o Ministério Público. O acordo da governança é um importante passo rumo à reparação integral e ao controle efetivo da Fundação Renova nos programas de reparação”, afirmou. Ele lembrou que o TAC firmado prevê a participação das pessoas e o foco nos atingidos, além de extinguir a ação da União e considerar suspensa, até a reparação integral, a ação dos Ministérios Públicos. “A ação do MP é mais ampla e prevê a auditoria dos programas da Renova para confirmar que os danos foram adequadamente reparados”, assinalou Zaneti, que é dirigente do Centro de Apoio da Defesa do Consumidor (CADC).

Saiba mais

O novo acordo modifica o Termo de Transação e Ajustamento de Conduta (TTAC) assinado pela União, os governos do Espírito Santo e Minas Gerais e as empresas, em março de 2016. No TTAC foram criados a Fundação Renova, o Comitê Interfederativo (CIF) e as Câmaras Técnicas que têm função de assessoramento do CIF.

A nova estrutura proposta tem três grandes alterações: a mudança do processo de governança do TTCA para definição e execução dos programas, projetos e ações da integral reparação dos danos causados; o aprimoramento de mecanismos de efetiva participação das pessoas atingidas pelo rompimento da barragem em todas as etapas e fases do TTAC e no novo acordo; e o estabelecimento do processo de negociação visando à eventual repactuação dos programas já em curso sob a responsabilidade da Fundação Renova.

O TAC também preconiza uma série de princípios a serem seguidos na nova fase, entre eles a centralidade da pessoa atingida no processo de governança, o fortalecimento da atuação conjunta e articulada das esferas de governo na proteção dos direitos das pessoas atingidas; transparência nas ações e acesso amplo e adequado à informação; a proteção dos povos indígenas, tradicionais e quilombolas.

Como vai funcionar

A principal modificação trazida pelo novo acordo é a participação das pessoas atingidas em diversas instâncias decisórias e consultivas. Isso se dará pela criação de Comissões Locais, Câmaras Regionais e um Fórum de Observadores e o direito de poder contar com o apoio de assessorias técnicas.

As Comissões Locais serão formadas por pessoas atingidas residentes nos municípios ou que tenha sofrido danos nas áreas atingidas. Inicialmente serão formadas 19 comissões, que contarão com apoio técnico, cursos e treinamentos para participar do processo de criação de políticas públicas com objetivo de garantir a recuperação e gestão sustentável da bacia do Rio Doce. Já as Câmaras Regionais constituirão fóruns de discussão, organização participativa e de interlocução com a Fundação Renova.

O Fórum dos Observadores terá natureza consultiva e irá acompanhar e analisar os resultados dos diagnósticos e das avaliações realizados pelos especialistas contratados pelo MPF, além de acompanhar os trabalhos da Fundação Renova, podendo apresentar críticas e sugestões.

Comitê Interfederativo

O novo acordo também altera a composição do Comitê Interfederativo, que tem a função de orientar e validar os atos da Fundação Renova. Agora, além dos representantes governos federal e estaduais e municípios atingidos, ele passará contar com três pessoas atingidas ou técnico por elas indicados, além de um técnico indicado pela Defensoria Pública. As Câmaras Técnicas, criadas para auxiliar o CIF em suas atividades, também passarão a contar com representantes da Defensoria Pública e do Ministério Público, assim como de dois atingidos em cada uma delas.

Fundação Renova

O TAC altera, ainda, a estrutura da Fundação Renova, pelo novo desenho, o Conselho dos Curadores terá dois membros indicados pela articulação das Câmaras Regionais, formado pelas pessoas atingidas. O Conselho Consultivo também passará a contar com sete pessoas atingidas ou representantes por eles indicados, dois representantes de organizações não governamentais, três de instituições acadêmicas e dois de entidades atuantes na área de Direitos Humanos.

A Fundação deverá, ainda, manter um programa de integridade (Compliance), com base na Lei Anticorrupção Brasileira (Lei nº 12.846/13), o Decreto 8.420/15 e as mais modernas legislações e padrões internacionais. Esse programa será submetido administrativamente ao Conselho de Curadores. Todos os trabalhos deverão ser acompanhados por auditoria externa independente, tanto de natureza contábil e financeira, quanto finalística da Fundação, bem como dos programas e de seus desdobramentos.

Revisão dos programas

O TAC determina que seja estabelecido um processo único de repactuação dos programas que visam à reparação integral dos danos do rompimento da barragem de Fundão. O processo de repactuação busca o aprimoramento dos futuros programas, não prejudicando, no seu decorrer, a manutenção, a continuidade e a eficácia das ações, medidas e projetos já em curso.

Esse reajuste será baseado nos diagnósticos de danosa socioambientais e socioeconômicos e estudos realizados pelos especialistas contratados pelo MPF, e somente terá início após a implementação das Comissões Locais e das Assessorias Técnicas suficientes para subsidiar as negociações.