Hilário Frasson vai ao Gaeco para depor em caso de juízes afastados
19/07/2021Os promotores de Justiça do Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (Gaeco) do Ministério Público do Estado do Espírito Santo (MPES) informam que o ex-policial civil Hilário Fiorot Antonio Frasson esteve nesta segunda-feira (19/07) no Gaeco para prestar depoimento no caso que envolve o afastamento dos juízes Alexandre Farina Lopes, diretor do Fórum da Serra, e Carlos Alexandre Gutmann. Eles são alvo de uma investigação que apura suposta negociação criminosa de uma decisão judicial.
Entenda o caso
O caso do envolvimento dos juízes Alexandre Farina e Carlos Gutmann com a suposta venda de sentença tem como base as provas obtidas na perícia realizada no telefone celular de Hilário Frasson. Houve o encontro fortuito de informações contidas em mensagens de um aplicativo utilizado pelo ex-policial civil, que aguarda na prisão e vai a julgamento pela acusação de ser um dos mandantes do assassinato da esposa dele, a médica Milena Gottardi, em 14 de setembro de 2017, no Hospital das Clínicas, em Vitória. Na ação penal do assassinato da médica Milena, “foi autorizada a apreensão e a extração de dados do aparelho celular do referido réu (Hilário Frasson), sendo verificados diálogos entre aquele réu e outras pessoas, sem qualquer relação com os fatos apurados na ação penal por homicídio, mas que revelariam robustos indícios de prática de crimes de corrupção passiva, corrupção ativa e exploração de prestígio, envolvendo dois magistrados, empresário, servidor da Amages, advogados e outras pessoas”.
Esses fatos, supostamente criminosos, extraídos do celular do ex-policial civil chegaram ao conhecimento do Gabinete da procuradora-geral de Justiça, Luciana Andrade, no final de dezembro de 2020. A Notícia de Fato para apurar a conduta dos dois juízes foi instaurada pela procuradora-geral de Justiça no dia 24 de fevereiro de 2021 e, em 31 de maio, foi protocolada uma Representação no Tribunal de Justiça. Nessa Representação foi solicitada a instauração do Inquérito Judicial e requerida as medidas cautelares em face dos juízes Alexandre Farina e Carlos Gutmann. Entre as medidas, o afastamento dos juízes e a quebra de registro de dados e metadados das contas de WhatsApp dos dois magistrados. Esta última foi deferida pela desembargadora Elizabeth Lorde em 7 de julho de 2021.
No entanto, o pedido de afastamento dos dois magistrados foi indeferido pela desembargadora. Diante disso, a procuradora-geral de Justiça ingressou com um recurso e o caso foi levado ao Pleno do Tribunal de Justiça, que, em 15 de julho, à unanimidade, acolheu a medida reivindicada pelo MPES e afastou Alexandre Farina e Carlos Gutmann. Além disso, os magistrados deverão permanecer a pelo menos 500 metros de distância das unidades do Judiciário localizadas na Serra. Também por unanimidade, o Pleno do TJES suspendeu o segredo de Justiça do Inquérito Judicial que apura irregularidades no Fórum do município. Como o sigilo judicial do caso foi levantado, todas as informações contidas no procedimento tornaram-se públicas.
Investigados
Além dos dois juízes, são investigados na suposta prática de venda de sentença o próprio Hilário Frasson, que até 2016 trabalhava em cargo comissionado no Tribunal de Justiça, como assessor em gabinetes de desembargadores (ele foi nomeado na Polícia Civil posteriormente), um ex-funcionário da Associação dos Magistrados do Estado (Amages), Davi Ferreira da Gama; e os empresários Eudes Cecato, sócio-administrador da empresa Cecato Negócios Imobiliários Ltda; e Valmir Pandolfi, dono do Frigorífico Forte Boi.
O grupo é acusado de supostas práticas de crimes previstas nos artigos 317 (crime de corrupção passiva, praticado por servidor público), 333 (oferecer vantagem indevida a um funcionário público, em troca de algum tipo de favor ou benefício) e 357 (exploração de prestígio, crime contra a administração da justiça e que consiste no ato de pedir ou receber dinheiro ou qualquer outro tipo de benefício, sob o argumento de exercer influência sobre servidores e autoridades do Poder Judiciário), do Código Penal Brasileiro (CPB).
Foi instaurada uma Reclamação Disciplinar pelo corregedor-geral de Justiça que tinha como alvo o juiz Alexandre Farina, acusado de suposta prática de corrupção e advocacia administrativa. Ela foi arquivada preliminarmente pelo Tribunal de Justiça em sessão plenária ocorrida em maio de 2021, deixando o TJES de converter a investigação preliminar (Reclamação Disciplinar) em Procedimento Administrativo Disciplinar (PAD).
No dia 12 de julho de 2021, a procuradora-geral de Justiça recorreu dessa decisão junto ao Conselho Nacional de Justiça (CNJ), protocolando o recurso pedindo a revisão da decisão proferida pelo TJES e instauração do PAD em face dos magistrados Alexandre Farina e Carlos Gutmann no que diz respeito aos fatos que são objeto de investigação do Inquérito Judicial que apura a suposta venda de sentença na Comarca da Serra.
Quebra de sigilo
Para comprovar os delitos cometidos pelos magistrados Farina e Gutmann e terceiros, a procuradora-geral de Justiça, Luciana Andrade, e o Gaeco solicitaram a quebra do sigilo fiscal dos juízes. Esses crimes, em tese, foram praticados em 2017.
Para a Procuradoria-Geral de Justiça, o envolvimento dos magistrados no suposto esquema de venda de sentença tem como base os diálogos encontrados no celular de Hilário Frasson. Essa prova já é bastante contundente e suficiente.
Num determinado trecho dos autos da investigação do assassinato de Milena Gotardi, os promotores de Justiça que atuam na 1ª Vara Criminal de Vitória (Privativa do Júri), verificaram que Dionathas Vieira, o executor, disse em interrogatório em Juízo que o plano idealizado por Hilário Frasson era que Milena deveria ser assassinada na Serra, onde ele (Hilário) teria um amigo juiz que poderia facilitar as ações no âmbito da Justiça e impedir que o grupo fosse investigado. Esse depoimento chamou a atenção dos promotores de Justiça que buscaram saber quem seria esse juiz.
Descobriu-se assim evidências quanto à prática de outros crimes, sem qualquer relação com o homicídio, nesse encontro fortuito de prova de outros delitos, que foi licitamente emprestada e encaminhada à autoridade competente para investigar, considerando a prerrogativa de foro, ou seja, a procuradora-geral de Justiça.
Autoria e materialidade
A manifestação ministerial traz trechos dos arquivos extraídos do dispositivo móvel que apontam indícios de autoria e materialidade em relação aos magistrados investigados, especialmente registros de chamadas e conversas no aplicativo Whatsapp, estabelecidas entre Hilário Antônio Fiorot Frasson e o juiz de direito Alexandre Farina Lopes, bem como entre Hilário Frasson e terceiras pessoas. Esses trechos revelam que o magistrado Alexandre Farina Lopes interferiu no julgamento do processo n° 0020366-58.2016.8.08.0048, cuja sentença foi proferida pelo magistrado Carlos Alexandre Gutman, com a finalidade de beneficiar a Cecato Negócios Imobiliários Ltda, em troca de contraprestação financeira indevida, que foi efetivamente paga por Eudes Cecato, sócio-administrador da empresa beneficiada.
Os diálogos e registros de chamadas telefônicas demonstram que o magistrado Alexandre Farina Lopes negociou o recebimento de vantagem indevida, intermediada por Hilário Antônio Fiorot Frasson e Davi Ferreira da Gama, funcionário da Amages, que mantinham contato direto com o empresário Eudes Cecato e com os advogados que representavam a empresa dele.
Por fim, o MPES esclarece que não há qualquer investigação em desfavor de desembargadores, deputados estaduais e servidores públicos estaduais – secretários de Estado – no procedimento instaurado a partir das provas colhidas no celular de Hilário Frasson.